A Preguiça Leva aos Porcos

AHá muitas década, vindo da área rural do Pampa, internou no Hospital Espírita de Pelotas (psiquiátrico) um paciente em estado catatônico, algo que era mais comum em meados do século passado. Não falava, não se mexia sem ser ativamente puxado, afeto embotado, olhos parados, completamente desconectado do mundo que o cercava (…). Foram várias as medicações, procedimentos e estímulos utilizados, mas nada funcionava.

Até que um dia, alguém o levou para os fundos do hospital, havia uma pequena horta e um chiqueiro com alguns porcos que comiam as sobras dos alimentos (sim, eram outros tempos). A visão dos porcos emprestou um leve brilho ao olhar do paciente. Imediatamente, pegou uma pá e começou a limpar o chiqueiro, deu água limpa para os porcos e, naturalmente, começou a comunicar-se sobre a melhor forma de cuidá-los. A partir daí, o tratamento ganhou outro rumo, até a alta hospitalar, ele seguiu cuidado dos porcos com dedicação e afeto.

Depois disso, por alguns anos, sempre que um paciente não respondia ao tratamento, alguém lembrava dos porcos e sugeria levá-los para um passeio na área agrícola. E, claro, não funcionava!

Era a utilização e leitura preguiçosa de uma experiência que havia dado certo por motivos específicos. Afinal, porcos faziam parte da história de vida do primeiro paciente.

Hoje, no Brasil, a leitura superficial da realidade e dos fatos, associadas à preguiça, buscam-se sempre a solução nos lugares que de certa forma deram certo, sem nenhuma análise mais aprofundada de toda a complexidade que levou aos desfechos.

No futebol, por exemplo, depois que o Flamengo de Jesus virou a final da Libertadores nos últimos três minutos, passou-se a acreditar que basta contratar um técnico português, ou que fale castelhano, e tudo se resolverá. Eles são os novos porcos que salvarão o mundo.

Não, não farei paralelo com a política! Não adianta insistirem.

P.S. Devemos aos porcos mais de quarenta produtos de uso medicinal (da heparina à insulina).

86Karime Mendes, LeontinpartilhasGostoComentarPartilhar

Sobre Hemerson Ari Mendes

Psicanalista (Sociedade Psicanalítica de Pelotas – Febrapsi - IPA), médico psiquiatra (UFPel), mestre em saúde e comportamento (UCPel). É diretor da Clínica Ser e durante 18 anos foi professor de Psiquiatria e Psicologia Médica na Faculdade de Medicina UCPel, atualmente, licenciado. Sim, também, disgráfico.

Publicado em 07/11/2020, em Psicanálise e psiquiatria. Adicione o link aos favoritos. Deixe um comentário.

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